A MÁQUINA DE FAZER VERDADE
Teatro por PalavradeDeus.com em 26/04/2004
(Mauro Ernesto Schmidt)
ATO ÚNICO
(Abre o pano - cenário)
Dois homens conversam. Um é o senhor, homem de aparência
rude e cansado, outro é um empregado seu, rapaz diligente e prestativo. Os dois
estão trabalhando, enquanto falam, numa espécie de máquina gigantesca, de bojo
grande. Tal máquina fora invenção do senhor, homem de conhecimento científico
aprofundado e eles estavam apenas ajustando os últimos detalhes no acabamento.
Enquanto o seu ajudante permanece calado, o inventor fala de sua vida passada
com amargura. Segundo ele não houve homem mais frustado em suas tentativas e
mais debochado por causa delas do que ele próprio. “O mundo só soube rir de mim
e meus trabalhos”, diz ele, “Eu sou um fracassado”.
Enquanto a máquina é preparada houve-se uma música ao fundo;
trata-se de um som metálico, quase mecanizado.
De repente, o inventor muda o tom de sua voz e passa a dizer
que ainda há uma chance para ele, que ele ainda irá vencer e daí então ele é
que vai rir do mundo. “Sim”, explica ele, “Ainda há uma chance para mim porque
na vida SEMPRE HÁ A SEGUNDA VEZ, SEMPRE EXISTE A SEGUNDA OPORTUNIDADE . E eu
conto com um grande aliado, o meu último invento A MÁQUINA DO TEMPO .
Ao pronunciar estas palavras, apontando para a máquina que
está perto de si, soa uma música delirante, quase fúnebre. A máquina é colocada
como uma heroína de batalha, como uma tábua de salvação.
A uma ordem do seu senhor, o ajudante lhe traz uma lista com
dizeres grandes. Nesta lista estão escritas as coisas mais importantes nas
quais o inventor havia falhado na vida, segundo o que ele acreditava. A lista é
breve e objetiva:
DINHEIRO
FAMA
MULHERES
POSIÇÃO
Em todas estas coisas ele havia falhado. Não conseguiu
dinheiro, nem fama, as mulheres nunca tinham nem olhado para ele e nem nunca
usufruiu de uma posição que ele achasse digna.
Mas agora tudo iria mudar, pensava ele. Com sua última
invenção, nada poderia fazer com que ele não se tornasse rico, famoso, cobiçado
pelas mulheres e merecedor de uma posição de respeito e honra dentro da
sociedade.
O plano do inventor não era complexo, apesar da complexidade
da sua invenção. Era seu invento visitar o passado primeiramente, em sua
máquina e aproveitar o seu conhecimento sobre este passado para fazer negócios
que lhe pudessem render bastante. Por exemplo, se pudesse voltar há uns 20, 30
ou mesmo 50 anos atrás poderia comprar terra que naquele tempo não tinham
validade, mas que ele sabia teriam, depois de um certo tempo. Poderia, pensava
ele, comprar as ações das companhias que só ele sabia iriam se tornar
importantes; poderia investir em shows, poderia tornar-se amigo de pessoas do
passado que só ele sabia se tornariam importantes.
Com este pensamento em mente, ele decidiu a partir-se:
“Primeiro visitarei o passado para me tornar um super-homem” - dizia ele - “E
depois irei ao futuro para ver o quanto eu estarei famoso, rico e benquisto nos
anos vindouros”.
E assim sucede. Doze horas por dia ele passa a sair em suas
viagens pelo passado. Os controles da poderosa máquina lhe permitem chegar ao
ano que ele quiser e mesmo à hora exata no passado. A máquina é agora
idolatrada por ele. Além dele só existe a máquina, para ele, neste mundo.
Ele pode ir e voltar do passado no instante que quiser. Os
controles da máquina o permitem. Por vezes, quando os negócios rendem, ele fica
5 ou 6 horas num mesmo lugar. Outras vezes, ele volta logo, dizendo que nada
deu certo. Mas através de suas especulações, ele realmente consegue coisas
importantes. Compra ações, terras onde o petróleo irá brotar, inventa
instrumentos que só daí a vinte anos seriam inventados, visita pessoas
futuramente importantes, até na loteria, em corridas e sorteios ele joga e com
seu conhecimento, não deixa de ganhar.
“A fortuna que estou amealhando é incalculável” - diz ele ao
seu ajudante, quando retorna das viagens. “Por vezes não dá certo os meus
negócios, mas SEMPRE HÁ UMA SEGUNDA CHANCE, SEMPRE HAVERÁ UMA SEGUNDA
OPORTUNIDADE . Eu falhei a principio, mas na minha segunda vez eu não vou
falhar”.
O tempo passa, e com ele vai-se firmando a alegria incontida
do inventor. Ele agora não só faz especulações. Visita lugares distantes, há
duzentos, trezentos, às vezes mil anos atrás para presenciar a história, e
para, segundo ele, “aprender com os grandes homens do passado o garbo, os
modos, a atraência de um grande homem, como eu serei”.
Às vezes, até brincadeiras faz. Por exemplo, certa vez ele
mandou que o seu ajudante ligasse a máquina para o passado, mas ao acaso, para
que ele não soubesse pra onde estava indo. E assim sucedeu. Ele, ao acaso foi
lançado no passado, há 1973 anos atrás. E o que vê lá? Nada mais, nada menos do
que Jesus Cristo sendo espancado e obrigado a carregar a cruz nas costas, em
direção ao local de sua morte. O inventor se surpreende, mas em seguida, faz
com que seja trazido de volta ao presente.
Quando ele retorna o seu ajudante, surpreendido lhe indaga o
porque da sua volta repentina.
“Voltei a uma época, na qual eu não poderia ganhar ou
aprender nada. Imagine, fui lançado ao local onde este tal de Jesus Cristo que
a história fala estava sendo levado para ser crucificado”.
O ajudante fica estarrecido de surpresa. “Mas e porque o
senhor não disse aos que os estavam levando que aquele realmente é o filho de
Deus, como ficou conhecido depois da sua crucificação?” - pergunta ele ao
inventor. “O senhor sabia que o mundo inteiro descobriu depois que eles estavam
matando um inocente, que eles estavam matando o filho de Deus! Por que não os
impediu? Por que?”.
“Ora”, - responde o inventor - “Não há tempo para estas
coisas. Eu preciso de tempo para mim, entendeu, para o meu futuro. Que é que eu
ganharia com isto? Hei? O que? Só complicação. E ademais eu sempre posso voltar
lá assim que eu quiser. Eu posso voltar lá sempre que eu quiser, se for o caso,
entendeu. SEMPRE EXISTE UMA SEGUNDA OPORTUNIDADE, SEMPRE HÁ UMA SEGUNDA CHANCE.
O ajudante baixou a cabeça. Tudo ficou por isso mesmo. O
incidente foi esquecido e o tempo passou depressa. As viagens ao passado
continuaram como dantes e o inventor sempre retornava com uma expressão de
contentamento.
Até que enfim chegou o dia supremo. Segundo o inventor, de
acordo com as fortunas que ele havia conquistado no passado, o seu futuro seria
grandioso. Ele estava pronto para, na sua idolatrada máquina do tempo, ir ao
futuro para ver a si mesmo, para ver a sua fortuna, os seus bens, e depois,
voltar ao presente e simplesmente esperar que os dias passassem para que o seu
brilhante futuro chegasse.
O inventor mostra-se ansioso e seu semblante denota
satisfação. Ele pede ao ajudante que lhe traga a lista das suas coisas mais
importantes. A lista é trazida. Nela, ainda se podem ler as palavras:
DINHEIRO
FAMA
MULHERES
POSIÇÃO
“Sim” - diz o inventor - “Agora eu vou ter tudo isto:
mulheres, fama, fortuna e posição, tudo isto”. “Agora” - continua ele - “o
mundo vai parar de rir dos meus fracassos e eu vou passar a rir do mundo. Eu
provarei ao mundo que para tudo EXISTE UMA SEGUNDA CHANCE, QUE SEMPRE HÁ A
SEGUNDA OPORTUNIDADE e que nesta segunda chance EU VENCI, EU VENCEREI ”.
Ele dá ordem ao seu ajudante que acione os controles da
máquina em direção ao futuro. O inventor leva consigo para esta primeira viagem
ao futuro a sua lista sagrada: MULHERES, DINHEIRO, POSIÇÃO, FAMA. Ele está
exultante.
“Ligue para 1985”
- ele ordena - E a viagem começa. Mas daí há instantes ele é trazido de volta.
“É estranho” - diz ele - “mas não havia nada lá”. “Vamos tentar novamente,
ligue para 1980” .
Mas desta vez também nada havia. O inventor surpreende-se.
“É estranho” - diz ele - “Muito estranho”. “Vamos tentar ainda uma vez mais,
ligue para daqui há dois anos, ligue para 1975” .
Uma música lírica violenta cai sobre o palco. É o clímax da
história. O inventor é lançado ao ano de 1975 e ele se encontra frente a frente
com o mestre Jesus. Este está em meio à declinação destas palavras:
“... Porque tive fome e me destes de comer; tive sede e me
destes de beber; era forasteiro e me hospedaste; estava nu e me vestistes; era
enfermo e me visitastes; preso e fostes ver-me...”.
E o inventor, com a sua lista apertada entre os braços é
empurrado e arrastado para a esquerda de Jesus, enquanto o pano desce e as
palavras célebres, são ouvidas:
Porque neste mundo o homem poderá
Tentar muitas em muitas vezes;
Porque neste mundo o homem poderá
Falhar e recomeçar. E ele terá uma
Duas, três chances.
Mas no reino de Deus, no juízo de Deus
O homem que foi julgado e colocado
À esquerda do Mestre, ao final da luta,
Este não vai recomeçar. Vai penar
Por não ter encontrado o caminho do céu
Ou por ter escolhido um caminho outro,
Mais tentador, mas errado e torto, para substituir
A verdade da vida.
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